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domingo, 27 de junho de 2010
Uma indicação Visceral
Um filme com esta seguinte sinopse: "Raimundo Nonato (João Miguel) foi para a cidade grande na esperança de ter uma vida melhor. Contratado como faxineiro em um bar, logo ele descobre que possui um talento nato para a cozinha. Com suas coxinhas Raimundo transforma o bar num sucesso. Giovanni (Carlo Briani), o dono de um conhecido restaurante italiano da região, o contrata como assistente de cozinheiro. A cozinha italiana é uma grande descoberta para Raimundo, que passa também a ter uma casa, roupas melhores, relacionamentos sociais e um amor: a prostituta Iria (Fabiula Nascimento).", não seria qualquer obra.
Trata-se do filme “Estômago”, que é claramente um filme “popular” se entendermos por “popular” um filme em que uma história é contada de maneira sedutora e que todos conseguem entender. Além disso, é um filme que permite vários níveis de leitura: uma leitura puramente baseada em entretenimento e outra análise mais profunda, ou seja, uma metáfora de algo maior que critica o nosso sistema social, ficando claro no final do filme, quando a ascensão de Raimundo Nonato é decorrente de sua perda de ética.
Além disso, o uso da culinária como mediadora das dinâmicas sociais é muito inovador como proposta cinematográfica, afinal as refeições devem ser consideradas um momento sacro e,do ponto de vista puramente artístico, é possível procurar a verdade nos aspectos mais simples da existência humana, nos aspectos mais básicos, essenciais e ancestrais, entre os quais a alimentação está entre os primeiros lugares.
Também vale ressaltar que, a trajetória de Raimundo Nonato – seus encontros, conquistas, desventuras, além de sua peculiar relação com as palavras – assume ares épicos (ainda que às avessas) quando percebemos seu encanto, estranheza e simplicidade (a princípio ingênua, depois violenta) com que se projeta na vida. Suas descobertas sobre a arte de cozinhar, o uso desta habilidade como perspectiva de forjar uma identidade que não se limita a permanecer fixa na cozinha e o modo como explora, nos universos que freqüenta, o poder de encantar e seduzir são os pontos fortes do filme.
Do mesmo modo, as figuras que vão aparecendo em seu caminho, como a prostituta Íria e o seu Giovanni, são referências importantes para caracterizar os vários aspectos de sua trajetória, valem dizer, empobrecida e marginalizada.
Além disso, o modo visceral com que as cenas são filmadas (com ângulos e movimentos poucos convencionais), a ótima atuação de todo o elenco e a música pertinente faz do filme um primoroso exercício de reflexão sobre a capacidade do cinema de produzir acontecimentos que comunicam exigências éticas, estéticas e políticas em nossas vidas.
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